sexta-feira, abril 27, 2007

Conversas sobre a Maioridade Penal.

A discussão sobre a diminuição da maioridade penal volta a aparecer, agora em decorrência da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) ter levado adiante o desejo desta nova regulamentação. Já teve sua primeira vitória no congresso e continua avançando por meio dos atos dos senadores “conservadores” e de direita, que tem o respaldo de grande parte da mídia “burguesa” e de uma parcela da população engolida pelo discurso reacionário.

No momento a diminuição seria para 16 anos em crimes chamados “hediondos”, além do trafico de drogas, no entanto isso é apenas uma parte do desejo da reacionária oligarquia. O deputado e ex-coronel Alberto Fraga, por exemplo, sugere que a idade limite deva ser fixada aos 11 anos de idade. É nesse ritmo que a diminuição da maioridade penal progride e tal como ela, os resultados práticos só podem ser funestos. Ao futuro qual será a nova diminuição, 4 anos, perguntar-se-á, pois não se vê pequenos meninos que nada tem tentarem “roubar”?

Em termos internacionais, em relação ao nosso próprio Zeitgeist (espírito da época), a diminuição é pouco embasada, pois o Brasil conta com uma média de crimes de jovens inferior a média que, pela ONU, é de 11,6%, enquanto o Brasil se encontra com 10%. No Japão, por exemplo, essa média é de mais de 40% e, no entanto, coisa estranha, a idade penal é de 20 anos. Qual é esse desejo de encarceramento que tanto o brasileiro precisa? Será que também não há uma confusão relacionada a uma criminalidade excessiva que é imputada aos jovens? Ou se trata do sensacionalismo promovido pelas emissoras quando há um jovem envolvido em algum crime hediondo como o de João H.?

Será mesmo que ainda acreditamos que é apenas através da violência e da tortura que as situações podem ser modificadas? Isso mostra a falta de perspectivas de outros tipos de relação e organização social e de inter-relações numa grande parte do imaginário popular. A solução é falar de um outro, de um “monstro” o qual não possui humanidade, é coisa, objeto. Ora, isto antes de ser algo que se relacione linearmente com os fatos é uma invenção, claro, com projeções energeticamente muito fortes. Não se trata de admitir essa mentalidade americanizada como efeito da violência dos jovens. Desta forma temos que nos perguntar de que forma a paranóia coletiva influi para esta realidade. Um medo de tudo, de todos, que impede as pessoas de saírem de casa, de se relacionarem e de viverem. Um medo que torna melhor uma solução que desumaniza o outro do que uma solução que o veja como humano, como parte também de fiações diversas, sociais, econômicas, imaginarias. Se pudermos falar alguma coisa que o ser humano é, acima e além de tudo, é possibilidade. Infelizmente isto parece estar sendo perdido.

Dentre o publico mais pobre, assim como na classe média e alta, é comum encontrar defensores dessas posturas carcerárias e mais radicalmente de direita, por exemplo: pena de morte. Vemos ai de que forma há uma ampliação da rede conservadora que elimina qualquer coerência de classes, o que vemos hoje é uma luta desumana pelo capital, tomado de forma divinizada. Não só isso, mas também um forte desejo de um grande Pai com os mil olhos de Argos. O ser humano é segundo plano.

Todos sabem da insuficiência das prisões, e também das “prisões” juvenis como padre Severino, no entanto, perguntemo-nos, quais seriam as conseqüências práticas da diminuição da maioridade penal? Primeiramente podemos cogitar que teríamos ou prisões individualizadas para menores, o que é muito pouco provável, ou estes seriam jogados nas prisões comuns. Com isto teremos, ao contrário de uma diminuição “de criminosos” nas ruas, uma especialização. Jovens agora não só com a experiência das ruas, mas com a experiência hiper-especializada das cadeias. Mestrado em criminologia, ou melhor, traficologia (infantil aquele que crê que o trafico e sua decorrente “guerra” será resolvida com medidas totalmente alheias a sua “essência”).

Estranho pensamento é o dos que imaginam que os jovens que cometem delitos ficam sem punição, ao contrário, são também levados a especializações do crime, a exemplo do que acontece no Padre Severino e outros. São prisões, certamente. O que mudaria com a lei seria o agravamento dessa situação miserável, o agravamento do desejo de vingança social com os menores. Certamente não há desejo algum de re-abilitação... Será que isso ainda existe?

Se, por um lado, é muito valido aqui o ditado: audiatur et altera pars (ouça-se também a outra parte), por outro temos que nos posicionar. É com razão que temos repulsa a toda morte e fealdade, com razão que vemos com horror a morte de João Helio e de tantos outros. Só podemos agradecer que ainda não tenhamos virado robôs, no entanto, o pensamento direitista só poderá no levar a mais guerra, a mais desigualdade e a mais humilhação.

Em Matheus 5, 14 lemos: "Vos estis lux mundi" (Vós sois a luz do mundo). É a população, i.e, nós mesmos, que deveríamos tomar medidas efetivas que alterem este quadro de coisas, mas como sempre preferimos continuar nosso jogo de projeções. Não me espantaria, neste estranho momento, o pedido de lideres fascistas pelo próprio povo. Nos colocamos como fracos, sem responsabilidade, é o “outro”, este “monstro inato” o culpado pelas atrocidades sociais. Nós, cidadãos de bem, não temos culpa alguma. Estranho pensamento. Mas ainda há esperanças, pois é no caos onde brilham estrelas cintilantes, de onde emerge centelhas das mais diversas. Novas consciências, novos mundos.

Ainda assim, mesmo em tempos onde a própria população miserável joga contra ela mesma, há de haver algum possibilidade de mutação, de transformar esta matéria bruta em ouro, rubedo.