segunda-feira, outubro 16, 2006

Compreensões acerca da psicopatologia contemporânea


A psicopatologia de base positivista, isto é, a psicopatologia dos manuais do DSM IV e SID, além do Compendio de Psiquiatria, apresentam alguns problemas sérios e que deveriam ser observados. A começar por sua ingenuidade científica, estes manuais não contém rigorosidade, pois, ao se considerarem científicos, não se dão ao trabalho de questionamento filosófico de suas bases, tal como, de suas próprias metodologias naturalizadas. É neste próprio movimento de ingenuidade, naturalização e busca de neutralidade que a psicopatologia perde, em nossa visão, toda sua base científica para entrar no campo do massacre social.

Ao não fazer esta analise ideológica-intencional de seu saber, mantém-se como instrumento de manutenção de uma ordem dominante, isto é, promove deliberadamente a tentativa de adaptação dos ditos loucos a sociedade, digamos em outras palavras: busca promover a re-adaptação do louco a média, ao instituído, ao trabalho alienado e a normalização estatística e inumana. O louco é alienado de toda causa-ação social, histórica, de todo movimento de sentido e relegado ao pano de marginal. É relegado ao plano de coisa, objeto, que desconhece qualquer vontade, desejo; o louco é aquele ser ontificado, onde toda sua criatividade é dita, como nos testes de Rorschach: “uma percepção mal vista”. Mal vista perante a média inundada de não vida e manipulada até os ossos, perguntar-se-á.

São incompreensíveis algumas das explicações “factuais” da nossa dita ciência psicopatológica. Sobram perguntas, e faltam respostas. Por exemplo, temos o caso dos assim chamados: “Sintomas prodrômicos” que seriam sintomas que apareceriam antes de em alguns casos de esquizofrenia (a esquizofrenia começando de forma linear, até seu desencadeamento), a outra possibilidade seria a esquizofrenia desencadeada de maneira não linear, abrupta. Estes sintomas poderiam durar até 1 ano antes do desencadeamento da esquizofrenia e seriam caracterizados pelos seguintes comportamentos bizarros (a palavra bizarro aqui já deve ser observada): retraimento social, as vezes o indivíduo se torna obediente, fantasioso, quieto, com poucos amigos, desenvolvendo interesse por idéias abstratas, pela filosofia, idéias místicas, interesse por questões religiosas, surgimento de idéias bizarras, queixas somáticas de dores, experiências perceptivas estranhas, descuido da higiene pessoal, comportamento incomum, ataque de raiva. Dificilmente todos os sintomas seriam encontrados, mas, comumente apenas alguns.

A possibilidade de definição de uma psicopatologia a partir das referencias dadas nos parece um pouco cômica e pode se tornar destrutiva na vida de um jovem, por exemplo, que por esse tipo de preconceito “científico” leva seu filho em fases de adolescência e conhecimento do mundo para um psiquiatra que, não salvo casos extraterrenos, lhe recomendará remédios. O estigma que marca um jovem levado a um psiquiatra pode ser grande, podendo vir a resultar numa série de comportamentos, claro que isso é uma especulação e que se levarmos em conta as subjetividades não poderemos chegar aqui a uma conclusão generalizante, especialmente por falta de estudo sobre o tema. Mas é interessante observar a violência e busca de adaptação obsessiva que se institui desnecessariamente.

Se tivermos a consciência de que diferentes pessoas se relacionam de diferentes formas com a realidade interna e externa, poderemos ter a compreensão de que existem pessoas introvertidas e outras extrovertidas, e é um tanto estranho uma classificação que privilegie um dos tipos psicológicos. Essa hierarquização de tipos nos parece filha da nossa sociedade, a qual procura, de maneira explicita, pessoas aptas ao trabalho, a produção e a criação de “coisas” que mantenham o sistema capitalista e “neo-liberal”. Para esse tipo de sociedade não é, supostamente, de boa valia pessoas introvertidas, que tenham interesses interiores, até porque esse tipo de interesse está intimamente ligado à criatividade e, paradoxalmente, a tradição. Sendo que toda originalidade é, em essência, subversiva. O novo é temido por qualquer movimento que procure a manutenção do atual. Está na hora da psicopatologia sair de sua explicação adaptativa e tirana, seja em sua defesa exagerada da máfia dos remédios (claro que aqui também não podemos cair no ponto opostos), seja em suas postulações rígidas e estratificantes, como também é o caso, diga-se de passagem, da estrutura na psicanálise.

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