“Todo aquele que bota a mão em mim para me governar é um tirano, um usurpador, e eu o declaro meu inimigo”. Começar o texto com uma frase clássica é uma ótima combustão para novas idéias e, nos tempos modernos realmente é de novas idéias que precisamos. Vivemos em tempos onde a força não mais é a principal arma de dominação dos detentores do poder e dos valores, ela é apenas um instrumento ineficaz perto das modernas armas da dominação. Se não é ela a maior valia da repressão e do controle também não pode ser ela o instrumento de mais valia na luta contra o controle, pelo menos, não enquanto os indivíduos continuarem paralisados como estatuas.
A tempos atrás e ainda hoje, temos órgãos como a igreja institucionalizada que mantém os valores necessários para a manutenção do ciclo nascimento-trabalho-morte em meio a total resignação das massas ao poderio intelectual, bélico, financeiro, moral e midiático dos duques sociais. As massas permanecem objetos de uso dos detentores do poder, ou simplesmente seres estratificados, presos a valores que não criaram, regras alienadas de si.
Por seres estratificados entende-se seres que perderam suas condições de humanidade, de possibilidade, mantendo-se de modo objetivo ou subjetivo, numa relação fechada no mundo, como o mundo fosse o já dado, como as relações sociais fossem as já conhecidas e tudo seguisse uma falsa causalidade linear que nada muda, uma causa sem efeito, um defeito espasmódico.
Hoje a estratificação faz-se por vários meios, como os condicionamentos desenvolvidos por psicólogos como Skinner e Watson, pela moderna psicologia comportamental cognitiva ou mesmo pela necessidade de sublimações do desejo das teorias psicanalíticas. Essas crenças são empregadas nos veículos de aculturação, a nossa valorada cultura, prima da doutrina. A estase de nossos desejos, de nossas possibilidades é inserida em nosso próprio corpo, o lar da mundanidade, do instinto e da valoração do que nos cerca.
O mundo, compreensão que será resultado do discurso do ser, ou seja, da ontologia, é também estratificado com o ser, já que não se pode separá-los como um fosse possível um sem o outro. A compreensão do mundo é sempre resultado de uma relação do mundo com a consciência não podendo haver objetividade, nem realidade per si, só é possível um modo de compreensão da realidade, o “o que é?” deve ser substituído pelo “pra que?”.
É justamente a realidade predicativa, nomeada e já ali que o ser deve superar, pois a totalidade está dentro e fora de si e lhe pertence, não há necessidade de criar o que já se possui, a singularidade. Para chegar a singularidade é necessário que o ser quebre o já conhecido, o já dado, a moral, os costumes, e chegue ao si-mesmo. Este caminho é justamente o caminho do descondicionamento, da quebra da autoridade, do enfrentar os conteúdos assombrosos que se projeta nos outros e reconhecer este como seu (muitas vezes a ganância, o egoísmo..), enfrentar a autoridade que deixa o ser em estado de submissão não permitindo o mesmo esticar o braços e gritar, possibilitar que suas potencialidade sejam manifestas.
Defacelar o já dado é sempre um árduo caminho pois este conta com artefatos de manipulação direta e indireta de extrema eficácia psico-física, como os reforçadores econômicos, sociais (amizades, parceiros sexuais, comodidade), e psíquicos.
Descondicionar-se é cair no abismo, experenciar a angustia e viver novamente, é o ciclo de vida-morte-vida, renascer como a fênix, restaurada, com novos olhos, com um novo corpo, em um novo mundo, este que agora é criado pela sua possibilidade de estar antes da valoração do ente, das coisas, do mundo. Estando onde nada ainda é, existe a possibilidade de tudo vir a ser, ai cria-se a ética – que é pessoal e não coletiva como a moral-, as valorações das relações, o mundo.
Ai já estabelecida a quebra da autoridade individual, psíquica, luta-se com vapor pela sociedade, o indivíduo deixa de ser pessoal e passa a ser coletivo, seu ego não mais existe e paradoxalmente é ai jaz a liberdade, existe uma meta-motivação, um estar além de seu tempo e de seus contemporâneos, visa-se o futuro e compreende-se o presente, mas não de modo a achar que é si mesmo superior aos outros, não se infla, se vive. É o sentimento de numinosidade que leva o indivíduo a seguir seu caminho individual e coletivo, ser único e viver por sua meta. Compreende-se finalmente que todo poder necessário a mudança está em si mesmo, no ser, ele é agora uma estrela, uma totalidade.
quinta-feira, junho 30, 2005
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