quarta-feira, dezembro 06, 2006

Conversas: Da Repetição à Criação

(post alterado)

PARTE I: Modelos Invariantes e a Lógica da Representação.

Pretendo apenas começar uma conversa entre discursos, sem recheio de citações, especialmente sobre o tema da invenção, ou da criatividade. Uma conversa crítica. Por criatividade não compreendo o movimento de solução de problemas simplesmente, por mais que a criatividade também possa passar por essa esfera de resoluções, mas também como criação de novos problemas e surgimento de algo que não se limita à mera representação, isto é, a repetição.
As escolas cognitivistas em psicologia, como a Gestalt e a Psicologia do desenvolvimento de Piaget, baseada em sua epistemológica genética, acabam por ressaltar a re-cognição na base da cognição e da percepção. Ressaltar a recognição significa dizer que elas, ao abordarem a cognição, criaram modelos de aprendizagem ou percepção “normais”, na relação entre sujeito e objeto, ambos objetificados, onde não haveria margem para uma modificação desses modelos. Acabam, portanto, por louvar um modelo estruturalmente fechado de cognição, de percepção, que limita o sujeito por remetê-lo a um “instituído” cognitivo, ao invés de abrir margem a modificações estruturais, da própria lógica que se baseiam.
A Gestalt, por exemplo, foi influenciada pela fenomenologia de Husserl, e procurou os invariantes perceptivos, como as leis da boa forma (o eidos do fenômeno, após a observação da variação eidética) no estudo da cognição. Ela acabou por falar da cognição como algo que está entre o sujeito e o objeto, na relação entre ambos, pressupondo duas categorias ontológicas distintas e marcadas, como se pode observar, por leis invariantes. Isso abre margem, por exemplo, a considerar tudo que está fora dessas percepções invariantes como patológico, irreal.
A relação do sujeito com o objeto, mediada pela cognição perceptiva, seria limitada não por aspectos ontogenéticos, como a memória ou outras funções pessoais, mas, como eu disse, por modelos universais como as leis de “figura e fundo”, “proximidade”, “semelhança”, etc fazendo assim um contraponto ao behaviorismo em voga na época. Ela, todavia, acabava por tirar o sujeito do condicionamento que destrói toda criação e inseri-lo numa nova lógica que também acaba com ela. Dessa forma, tudo que foge ao equilíbrio da boa forma retornaria a ela, mesmo que sobre um outro aspecto. A criatividade ai se resumiria aos famosos inghts, que seriam reestruturações cognitivas, que não podem ser confundidas com invenção, pois se trata, na melhor das análises, em meras “soluções de problemas já dados”. Logo, a cognição mesmo quando sai de seu foco padrão, se voltaria a um outro padrão, a uma outra forma cognitiva a priori.
Já Piaget, apesar de colocar o tempo no estudo da cognição, colocá-la no próprio desenvolvimento ontogenético do sujeito, acabou por não escapar das mesmas invariantes. Na teoria de Piaget, com sua lógica científica, uma pessoa se limita a sua própria estrutura cognitiva momentânea, para assimilar ou não determinado fato. Existem, para essa teoria, diversas estruturas cognitivas hierarquizadas (a criança precisa de descentrar para apreender outra lógica e se recentrar num modelo superior). Falando das fases do desenvolvimento da criança, acaba por limitá-las a um mesmo processo universal e generalizante que massacra o diferente, que não está contido em suas categorias. A lógica que o move é a lógica científica e, no movimento teleológico que cria, acaba por identificar o desenvolvimento final com a ciência positivista, com a criação das hipóteses dedutivas no pensamento do sujeito.

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